FIGOS



Há poucas coisas mais eróticas, do que ver uma mulher a comer um figo. Utilizando apenas as mãos, começa por o abrir ao meio, revelando duas metades móveis, de tinta gradação. Leva então a primeira metade à boca. É impossível que o faça sem se lambuzar, sem alguma sofreguidão, sem um verdadeiro prazer físico, que resulta mais da aproximação material do objeto, do que do seu doce sabor, mais da textura do seus filamentos interiores, do que da sua frescura. É preciso alguma insistência para o comer completamente, lambendo e raspando, com a língua, os lábios e os dentes, até que resta apenas uma pele fibrosa, de vinil, perfeitamente limpa.

Depois, por momentos desperta do seu labor, procura saber se está a ser observada, e avança para a segunda metade. Não é menos sôfrega a segunda volta, mas reavivada a memória física, articulados os gestos esquecidos no último verão, é agora menos desajeitada e hesitante – mais direta.

 

Li, que a figueira é uma das primeiras árvores referenciadas no Antigo Testamento. Adão e Eva, depois de comerem o fruto proibido, tomam repentinamente consciência de que estão nus e, sentindo vergonha, cobrem-se com folhas de figueira. Dizem ainda outros, que o fruto proibido seria o próprio figo e não uma insípida maçã, nunca mencionada no texto original e introduzida por um posterior erro de tradução.

Por outro lado, diz-se que foi à sombra de uma figueira que Buda encontrou a iluminação suprema.

 

Quantas de vós têm agora vergonha de comer um figo à minha frente?


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