UMA ABELHA NA CHUVA, CARLOS DE OLIVEIRA
Carlos de Oliveira é brilhante no uso linguagem, de um apuramento notável, e não menos na composição. Na análise deste romance, devemos, como diz o Dr. Neto (personagem do dito), partir do real e concreto, para o abstrato e complexo. Neste caso, partir da pequena comunidade de Montouro para uma caracterização da sociedade portuguesa no tempo do Estado Novo. Silvestre (pequeno burguês, gordo, indolente e covarde) casou com Maria dos Prazeres (filha de fidalgos decadentes e falidos). Maria dos Prazeres é a abelha rainha e o motor de uma colmeia bem pintada por fora, mas putrescente e disfuncional por dentro – alimentando-se de ressentimento produz apenas fel. Maria dos Prazeres vive um vazio impossível de preencher: reduzida a uma pequena burguesia soturna e canalha, cambaleante na sua mesquinhez, cheia de remorsos fingidos; no quarto gélido, a sua sexualidade reprimida (função primordial da abelha rainha) lateja: pelo cocheiro Jacinto; e mesmo na admiração pelo cunhado que foi para as