MÁRIO

 



Mário caminha em bicos de pés 
Como um bailarino aposentado
Tira a roupa da máquina fazendo pliés 
Pendura-a no estendal fazendo
Saudações ao sol. Abre a porta
Com uma vénia de samurai
Coloca os rissóis no óleo a ferver 
Com um adejar do Bolshoi.
Anda sempre assim
Para todo o lado e propósito
Sobre os seus chinelos cambados
Fugindo-lhe a barriga por debaixo
Da roupa subitamente curta
Cheia de nódoas ou migalhas.
Ainda assim, consegue chegar
Com facilidade aos dedos dos pés 
E faz Yoga num tapete de Arraiolos 
Que herdou de sua falecida mãe.
Coloca uma fita na testa
Como a Jane Fonda
E transpira abundantemente 
Ao mínimo movimento.
Recita também os poetas gregos
Dirigindo-se aos pombos no jardim
E franze acentuadamente a testa
Segurando junto aos olhos
Livros de filosofia alemã.
A cada 5 minutos 
Fecha-os sobre o colo 
Pousa o indicador direito sobre os lábios
Enquanto o polegar ampara 
O queixo bojudo, como quem
Matuta na vida. 

No supermercado, no café, todos conhecem o Mário.
O Mário não bate bem, dizem.
O gordo não bate bem.
É trolaró. As senhoras mais velhas 
Dizem que ficou assim desde que lhe morreu a mãe. 
O Mário não tem namorada. Nunca teve. 
Não trabalha. Não paga impostos. 
Não contribui para a sociedade. 
Não estimula a economia. 
O Mário está a cagar-se para o PIB
O desemprego, a inflação 
O orçamento de estado
E a carga fiscal
O investimento estrangeiro 
O preço do barril de brent
As remessas dos imigrantes 
Ou a sociedade da informação.
Não sei o que interessa ao Mário.
O Mário ajuda as velhinhas
A carregar as compras
E às vezes come tofu frito
Porque se compadece dos animais
O Mário nunca fez mal a ninguém 
O Mário não é economicamente viável
O Mário é um peso para a sociedade. 

Todos acham que o Mário não bate bem
Ainda bem que o Mário existe. 


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