O MEU CAVALINHO ROCINANTE


O antagonismo do mundo é frequentemente menorizado.
Até parece que é plenamente justificado.
Em estado de guerra tudo é justificado – é claro.
E é em guerra permanente que o mundo está.
Um carrossel, cujo mecanismo tem sido progressivamente oleado e que não suporta hesitações:
Se não queres ter um televisor, um serviço de televisão por cabo e ainda mais uma merda de uma subscrição para ulterior entretenimento;
Se não ambicionas fazer viagens ao estrangeiro, onde poderás pernoitar em hotéis de luxo e cagança e deglutir maravilhosas refeições preparadas por terceiros, seguir programas culturais, desportivos ou simplesmente torrar numa praia de areia branca e águas mornas;
Se não queres ter vários dispositivos eletrónicos que podes acariciar livremente durante todo o dia como a gato;
Se não queres aparecer perante a tua família na noite de consoada sem mercadoria de valor para trocas diretas e providenciar às criancinhas um feliz natal;
Então, não tens lugar neste mundo. Estás fora do carrossel. Estás apeado.
Talvez não estejas fora, o que é ainda pior, pois serás com certeza cuspido pelo movimento centrípeto – este mundo espera que te agarres com as duas mãos.
Para quem está em cima do carrossel, viajando a toda a velocidade, é até pouco compreensível que alguém, apeado, estique a mão para o carrossel.
Que poderá querer afinal? 
Porque é que não se agarrou bem em primeiro lugar? Este mundo não é para distraídos.
Não irá com certeza toda a gente abrandar para que vossa excelência possa subir… 
Nem sei bem quem é que pôs o carrossel em andamento, nem por que razão vamos tão depressa – isso não vem agora aqui ao caso –, mas eu não me quero apear, estão todos cá em cima. 
E ainda menos correr o risco de largar uma mão do meu cavalinho rocinante – que eu não caio nessa.


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