EU CANTO E A MONTANHA DANÇA, IRENE SOLÀ (Tradução de Rita Custódio e Àlex Tarradellas)
A
proposta de Irene Solà neste livro é bastante ambiciosa. Recusando uma visão
antropocêntrica da realidade, dá voz a animais, nuvens e montanhas, num romance
polifónico em que os acontecimentos são narrados segundo diferentes
perspetivas, num tempo indefinido, no qual mortos, vivos e espíritos se cruzam,
e as montanhas crescem do mar. É, contudo, a linguagem quem nomeia e anima, se
as montanhas dançam é porque ela canta.
Cheguei ao livro com expectativas elevadas, por tudo
que tinha lido e ouvido acerca do mesmo. Isso costuma ser uma desvantagem à
partida – mas nem sempre. Encanita-me também a questão de originalidade,
amplamente propalada neste caso – é que, bem vistas a coisas, esta é tão rara,
como inconsequente: como costuma dizer um conhecido livreiro da praça “se não conheces
é novidade”. Talvez devido a estes preâmbulos, foi uma leitura um bocado
irritante. Acho que, não sendo um mau livro, falha de muitas maneiras e a execução
está bem a abaixo das pretensões. O problema não é tanto a deriva em que a
autora nos conduz, mas sim chegarmos ao fim de mãos vazias, sem um único
escolho que nos salve, ou sequer a marca de uma traulitada. Na sua raiz, a
história é fraca, nada é aprofundado, e a linguagem não é suficientemente
excitante para suportar as faltas anteriores. A tentativa de se afastar de uma perspetiva
antropocêntrica é, por vezes, de uma ingenuidade imberbe, que derrota o seu propósito
(os episódios do cão e urso são exasperantes). Portanto, depois de umas voltas
nesta máquina de lavar narrativa, aterramos com a ligeira sessão de viagem, mas
perfeitamente no mesmo sítio.
Esta opinião vale o que vale, mas entre tantas opiniões cinco estrelas, talvez adicione um bocadinho de tempero.
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