DESMESURADA FALTA
Se acendes um cigarro
Logo incendeias o vestido
E no escuro dos teus olhos
Habita um torpor
Como o de Maldoror
Esticas os caracóis
À sombra das cameleiras
Falas línguas estrangeiras:
Na curvatura do teu dialeto
Mora um estranho afeto
Fazes bolos de massas finas
Mousses de lima e estricnina
Entre espumas e geleias
Deitaste com as lampreias
Trincas dedos e segredos
O teu obscuro sangue
Não há quem o estanque
E de tal eflúvio cantante
Sopra um lento de levante
Ataviada de estolas
Sopras fumo em argolas
É ígnea a tua estirpe
Com perna de antílope
E pestanas de avestruz
Escondes-te da luz
Gostas da madrugada
Onde cantas calada
E o teu doce fragor
É de quem não sente dor
Mas desmesurada falta
Que no teu regaço se exalta
«Tenho curiosidade de saber como descobriste o local onde habita a minha imobilidade glacial, rodeada por uma longa fileira de salas desertas, imundos ossários das minhas horas de tédio. Como dizê-lo? Quando penso em vós, o meu peito estremece, ressoando como a derrocada de um império em decadência; pois a sombra do vosso amor revela um sorriso que talvez não exista: ela é tão vaga, e movimenta tão tortuosamente as escamas!»
-- Conde de Lautréamont, Os Cantos de Maldoror
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